4 de nov. de 2017

Skate nada no sangue



Subi no skate com 15 anos, de lá pra cá vão fazer 10 anos, foram praticamente 6 regrados dos 15 aos 21, andando de 4 horas até 10horas diárias. Talvez pudesse ser encaixado entre os esportistas mais fanáticos, sabe? No que diz respeito a prática. Lembro que com 17 anos eu não me dava o direito de voltar pra casa sem voltar 10 backslide talslide, haha, eu levava tipo umas 20tentativas pra acertar um, e lembro que todo dia quando chegava com uma listinha de tricks na mochila eu pensava “hoje eu tenho que acertar um antes de 10 tentativas”. Tempo recompensador, dali seis meses eu lembro de dar bs tail em qualquer borda de qualquer lugar, tanto na escola, como em caixotes extensos de campeonatos diversos, bons tempos.

Uma característica interessante que noto ter até hoje é a pegada explosiva, vamos chamar assim. Algo como dar toda energia que você pode pra uma manobra só, pra um pequeno percurso. Então eu remava forte, eu dava o bs mais alto que o caixote, e sentava o peso no pé esquerdo de costas, porque skate é assim, ficar muito no macio é coisa de emo.

Entre torcer a camisa 5 vezes em um dia a ponto de comprar remédio pra hiperhidrolise ou ficar tão exausto que o momento que você cai no chão o corpo pede pra parar, e dava pra fechar os olhos e dormir, mas só o pensamento de mais uma tentativa te faz de um instante pro outro se ver correndo com o skate na mão pronto pra voltar a “final bang”.

Dentro da vivência no skateboard pude notar diversas coisas que auxiliaram a evolução, como não ter vergonha, aí não há problema em errar ou remar mancando de switch, ou independente da pressa explosiva ou da calma reflexiva, as duas formas custam tempo na evolução, até porque a porra toda passa a não importar num esporte infinito.

Penso que entender o skate como jornada é equivalente a preencher todos os aspectos da vida em seus detalhes dentro do mesmo. Como saber que fazer um tcc pode ser como um hardflip fs bigspin, ou não ter dinheiro no final de semana tem a ver com a diversão ta lá todo dia mesmo, não era álcool a diversão.

O skate dentro de uma cidade plenamente skatável dentro de determinado extensivo prazo desde o começo das remadas até os últimos grinds quando não se tem mais joelho nem idade pra andar de skate, todo o processo significou mais do que as infinitas tricks que se aprendeu e esqueceu, que acertou e que nunca tentou, que desistiu ou que quebrou peça, no fim, o que resta de valor é apenas a experiência. Quero dizer, quantos vôs vão dizer pros netos que voltavam nollie flip crooked nos dias de chuva? Ou explicar a sensação de um aéreo sendo que nem pular de paraquedas ou em uma piscina se iguala a uma rampa e 40cm de 1 segundo no ar?

A resposta está no clássico skate que nada no sangue do skater, não é mesmo? Mesmo enquanto metáfora, que essa invenção de shape sobre todas é parte de mim e extensão do meu corpo, também remete a maneira como eu vou ver o mundo.

É dignamente um problema subir as escadas do muffato sem imaginar um 3flip na mesma, ou descer as escadas da faculdade sem enxergar um nollie crooked, até mesmo passar pedalando por uma calçada de cimento queimado e ter certeza que ali é um pico de manual...

As possibilidades são tão infinitas, que ao se encontrar limites, funcionam como obstáculos reais, isso em cálculos possibilitando voltar ao loop de soma em possibilidades: existem X manobras de solo, adicione um trilho e teremos x manobras de solo + trilho. Adicione as manobras de saída e teremos x + trilho + Y, ou trilho + Y. Isso pra um obstáculo...

A verdade é que mesmo sem poder adjetivar ou definir skate, entender que é todo um caminho sem fim, recompensador, difícil e amaldiçoado dentro da vida de um skater, o tempo já não importou mais, as tricks ou por onde se andou, apenas os valores a vivência em cada momento digno de ter sido bacana ou tenso.